29.6.12

desventuras

Como dormir se mil ideias, tormentas e baboseiras passam pela tua cabeça à mais de mil?
Fiquei pensando que na vida existe mesmo essa tal de linha tênue, entre o fracasso e a miséria.
Em todos os campos, eu diria. São tantas desventuras nesse caminhar que por vezes me questiono por que é que não estanca logo tudo de uma vez só.
Excessiva, é bem o que eu sou ou era. Tenho pensado muito em me transformar em alguém que cause menos danos. 
Essa loucura que me tira do eixo tem me feito um mal que não é só meu. E tem doído tanto. 
Dizem por aí que é o preço que se paga por pregar peças no destino. Existem todas essas linhas incongruentes como dois e dois são cinco. 

Agora, talvez mais tranquila, após chegar ao chão de forma lirica e acolhedora, bêbada! 
Desejo estar sentada ao lado da paz, para que assim, talvez possamos nos resolver com nossas distancias. 
Cansei dessa falsa liberdade que é vazia.

Ainda quero a casa na arvore, o pé de pitanga, o amor, os gatos, os cachorros, as andorinhas não! 


20.6.12

Findar.

Chove incessantemente. Ouço Tom Waits.
É muito aconchegante esse corpo que escolhi para morar. Embora eu não o trate com zelo.
Prezo muito minha liberdade, acabo gastando excessivamente o corpo. Depois desse, acho que serei um pé de pitanga. Gosto das flores antes do fruto. Não encontro nada em que eu possa me entregar completamente, vou me doando às pessoas, aos pouquinhos.
Mordo a carne, bebo o sangue. Embriago-me todos os dias. 
A vida se esvaindo passa tão ligeiramente que não sei quem sou. Não reconheço-me.
Você, leitor, também se sente assim? Transbordo e deixo chover.
Volto a dizer coisas que guardo no meu intimo, me sinto descartável perante a vida. 
O que é vida, senão um amontoado de sensações e olhos e mãos e bocas e carnes de todos os tipos.
Nascer, doar-se, sangrar e morrer. 

Findar! 

Matei. 
Morri.

11.6.12

II


A cama continua vazia. O cigarro ainda aceso já quase me queima as pontas dos dedos.
Ouço-te madrugada a dentro como se estivesse em mim. E está. 
"olá, como vai você que vive aí a se esquecer" a canção me pergunta. 
Acendo outro cigarro, o desejo ter algo em mãos me sufoca. Um trago longo me prende, solto a fumaça e me desfaço junto com ela. Questiono-me sobre todas as coisas à minha volta. O que é real? 
Compreender não me parece tão real quanto sentir. Sinto! Existe algo tão maior. 
O cigarro já não é o mesmo, é solitário. Fumaças que não se cruzam não levam à lugar algum. 

Saldo da noite: a insonia hoje é mais real que ontem, e a fumaça não traz vida pra perto, embora me arraste junto com ela.


5.6.12

Canibalismo, sim.

Olharam-se durante algum tempo, em uma casa que não era dela.
Olharam-se um pouco mais, sorriam com os olhos. Então ela sentiu um sopro frio subindo a espinha dorsal e riu à beça. Caminhava meio sem rumo, precisava respirar. Sentou-se no corredor de fora, e ouviu folhas cantarolando cantigas, enquanto dentro da casa tudo acontecia. É preciso se segurar, é preciso se segurar em algo. Não! É necessário permitir-se. Permita-se. Permita-se. Permita-se sentir ou não sentir. Dentro dela havia uma vontade imensa de devorar pessoas, mastiga-las, dilacera-las, engoli-las à esmo. Tantos corpos no jardim já havia enterrado, mas nunca provara a carne de ninguém, assim, canibalismo não. Canibalismo? Sim! Decidiu então comer, sem ser com os olhos, agora com os dentes. Antes era necessário um golpe certeiro que imobilizasse a presa e a deixasse livre para degustar o corpo alheio. Lembrou de todos os outros corpos que havia enterrado no jardim enquanto tirava a camisa do corpo jovem estirado no chão da sala. Corpo esse que ainda estava quente, passava as pequenas mãos nos mamilos, mordia, puxava, ria, mordia, puxava. Com um  punhal em mãos, tratou de abrir o peito sugando todo sangue que escorria, brincava com a língua por aquele corpo quase morno. Cravou os dentes, puxou, não aguentou mastigar, engoliu. Tremia feito bambu verde. Tentou de novo, dessa vez mastigou lentamente, sentia algo desconhecido descendo pela garganta e explodindo em seu estomago. E então sentiu que poderia morrer naquele instante, agora o punhal desbravava seu corpo jovem e cheio de vida. Dois golpes no peito foram o suficiente para que deitasse ao lado do outro corpo e sentisse todo o barato de ser, humano.